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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

CHOROS DAS SEXTAS



A história da pré-revolução angolana demonstra que a maioria dos meus antepassados não se exprimia em português, facto que não prova que gentes da minha terra eram mudos ou parvos. Por consequência a riqueza da minha cultura bem prova a coerência da comunicação musical e verbal empregue nesta comunidade. A selecção ou escolhe de nomes era um instrumento comunicativo muito decisivo para os bakongo, porque cada nome carrega consigo determinada história duma família, clã, tribo ou duma certa comunidade. Isto é a base em que repousa a importância e o significado de cada nome que se coloque aos descendentes, mesmo aos animais domiciliares.

Para mim possuir um grande nome é mesmo inspirativo: partindo duma simples curiosidade ate embarcar as profundidades do núcleo da investigação. Assim fui nascido com a denominação de Nkituavanga II, já que o meu falecido pai era o Nkituavanga primeiro. Este apelido que se traduz por: que fizemos ou o que fizemos. Ora, uma vez procurei curiosamente, solicitando meu velho para descobrir o que realmente ele fez, ou talvez que alguns pertencentes a família tinham feito. Nunca na sua réplica evocou a palavra ‘’niet’’, se não for deixar escapar dos seus lábios um simples sorriso amigável, que remetia a conversa por uma outra oportunidade. Infelizmente a vindoura oportunidade tão esperada nunca iria surgir uma vez o meu pai viria sucumbir nas matas fugindo a UNITA que havia ocupado as terras santas do norte de Angola, projectando assim a minha vida numa orfanato antecipado. Hoje transbordei a minha curiosidade para com a minha mãe que também prefere enviar-me investigar o significativo deste curioso nome fazendo uma leitura do tempo; que prova?

Que fizemos ou o que fizemos (Nkituavanga) na minha profunda observação e na lógica da minha investigação deveria se terminar com um ponto seja de exclamação tanto da interrogação. Isto dependendo das circunstancias em que o sujeito se encontre ou da posição que o mesmo ocupa na hora da proclamação emocional ou sentimental. No entanto seria anormal e incorrecto o nome de num indivíduo se termine assim com um ponto qualquer. Concretizando a realidade deste nome num cenário prático, quem assim atira este apelido com um ponto de interrogação (Que fizemos?) procura conhecer porque vem sendo punido, quando inocente é. Talvez porque vai sendo continuamente sujeito às queixas ou perseguições quando está carimbado com inocência. A tonalidade com que se invoca este nome prova que o castigo é violento, sente-se a brutalidade onde as consequências são físicas.

Que fizemos! prova que o sujeito está ainda livre mas sofre pressões duma injustiça qualquer. Ele não está acreditando o que se passa para com ele mas a tortura é ainda verbal/moral.

A leitura do tempo nunca foi em nenhuma parte fácil porque o tempo é muito imprevisível. O tempo das actualidades sociais já não respeitem as normas e as regras que gerem a tal sociedade. O tempo social do dia-a-dia do angolano é manipulado pelo político e desfigurado pelos profissionais da arte da bajulação e média, sabendo também que a história do povo angolano vai sendo montado peça por peça nos laboratórios daqueles que detêm o monopólio da mentira.

Quando faço a leitura do tempo fico sempre confuso. Confuso porque não sei qual ponto colocar nesta situação. Eu tenho feito perguntas aos incógnitos e exclamo no vazio. Não tenho quem me responder ou simplesmente não vejo quem me responder. Todos sabem que sou inocente mas preferem o silêncio, e regozijar-se dos meus sofrimentos. Isto é a cobardia do homem mas…

Este meu nome não é a profecia do meu falecido pai? Sabendo que ninguém no seio da sua família cometeu, será que algum lado alguns bakongo cometeram? Injustamente fomos acusados e condenados em 1975 dali digo Nkituavanga? Isto só porque alguém da casa pensou em criar um movimento e iniciar a guerra da libertação. Isto só porque alguém quis ganhar a luta e teve maquiavélicamente uma genial estratégia de diabolizar nosso povo. Para sermos malvistos nas ruas e mesmo nos bairros fomos então em 1992 acusados e massacrados nas nossas casas: dali digo Nkituavanga? Isto só porque temos uma terra que faz fronteira com o Zaire (RDCongo). Isto só porque falamos mal português e fomos nascidos em Cabinda, Zaire e Uíge. Isto só porque cometemos o pecado de vivemos no Mabor e Palanca. Somos acusados porque alguém incapacitado pensa distrair o resto da população dorminhoco!

Este fim da semana muitos vão festejando, mas nos estamos fechados nas casas tentando responder: O que fizemos? Este fim da semana perdemos em Luanda os nossos filhos, irmãos, netos, sobrinhos, primos enfim parentes só porque alguém preferiu acusar-lhes de toda a maldade e colocou um adjectivo condenativo nas suas vidas devido os interesses político-económicos. Todos bem sabem que somos inocentes mas escolheram a via do silencio deixando os bakongo no sofrimento, e vão alegrando-se da sua eterna condenação.

Será que meu pai soubera que um destes dias seremos falsamente acusados e eternamente condenados. Será que meu pai sabia que nenhum dos actuais (eternais) dirigentes tossira palavra para rectificar a condenação? Mesmo os comparsas da equipa governamental cruzarão as mãos rindo-se dos bodes expiatórios?

Num deste fim da semana houve massacre de bakongo que ninguém pode negar mas cujo resultado do inquérito ficou nas gavetas do governo como sempre. Esta memória resta impagável na consciência dos comanditários, dos actores mas também do povo sacrificado.

Que as lágrimas dos bakongo entoam, Nkituavanga!


Nkituavanga II